Space invaders: os genes "saltadores"

Não falo dos Space-invaders, o jogo clássico do Atari, o avô dos videogames, mas sim dos SPIN's, uma "família" composta por sequências genéticas conservadas, egoístas e móveis, conhecidas técnicamente como transposons*, e recentemente identificadas recebendo o apelido do velho jogo. Até ai tudo bem, os transposons foram descobertos nas décadas de 40-50 pela botânica Barbara MacClintock, e tem como característica se movimentar pelos cromossomos, são conhecidos por causarem mutações, devido a sua inserção ao longo do DNA, e o mais incrível é que podem se movimentar entre diferentes espécies de seres vivos. De acordo com a síntese moderna da evolução, os traços dos organismos são herdados através dos seus pais, verticalmente (cima para baixo,) sofrendo mudanças ao longo do tempo, uma das idéias principais de Darwin, a qual ele chamou de descendência com modificação.

O problema que esses pedaços de DNA, os transposons SPIN, surgiram aparentemente do nada, se infiltraram no organismo em algum ponto da sua história de vida, e não foram herdados de um ultimo ancestral comum, sugerindo a hipótese de transferência horizontal gênica, que seria uma transmissão de genes entre espécies espécies diferentes, e nesse caso de classes diferentes de animais! pois os SPIN's foram encontrados num roedor (Murinae), no galago (um prosímio), tenrec (mamífero), no morcego marrom, no gambá (em inglês opossum, um marsupial), e estranhamente em uma espécie de lagarto, e uma de anfíbio, o sapo com garras africano. Como as sequências genética desses elementos, são ≈ 98% idênticas nestas espécies, surge a necessidade de se explicar e entender como elas foram parar nos genomas de espécies tão distantes evolutivamente. Diante desse cenário, surgiram duas explicações hipotéticas: ou os SPIN's foram herdados verticalmente (de pai para filho) do último ancestral comum entre o grupo tetrápode, a aproximadamente 360 milhões de anos e foram altamente preservados nessas linhagens até hoje, ou foram introduzidas horizontalmente, e se espalharam nas linhagens que vieram após. Como a análise da "árvore genealógica" das espécies (veja aqui) que possuem os SPIN's não segue um padrão, sendo encontrados dispersamente entre elas, e assumindo que para ser um caractere derivado do ancestral comum a todos os tetrápodes, os genes teriam sido perdidos por todo o grupo, e preservado somente nessas espécies, a hipótese mais provável é a de transferência horizontal de genes, e mais ainda, de forma transoceanica, pois de acordo com os dados, a "contaminação" pelos SPIN's ocorreu por volta de ≈ 40 milhões de anos atrás, em continentes diferentes.
Essa história levanta mais questões do que parece responder. Como ocorreu a transposição desses elementos? pode ter sido um vírus ou bactéria, numa relação parasita hospedeiro, ou de outra forma ainda desconhecida. Quais foram os eventos "fortuitos" que culminaram na aparição, praticamente na mesma "época" nas linhagens ancestrais dessas espécies. Será que houve algum tipo de epidemia, ou pandemia?(dúvidas do autor do blog).
Esses casos e descobertas que ocorrem nas entranhas da evolução das espécies, mostram que a fiação do tecido da vida, é mais complexo, inconcebível e emaranhado que qualquer imaginação ou idéia que temos sobre a origem e desdobramento dessa coisa tomada de estranheza, que é a vida na terceira rocha depois do Sol.

*Os elementos transponíveis podem ser de dois tipos: tranposons, que funcionam através do "recorta e cola" (cut and paste) através da enzima transposase, via DNA, e os retrotransposons, que são do tipo "copia e cola" (copy and paste), através do RNA.

Referências:
O artigo já foi discutido aqui: RNAse Free e no Discutindo Ecologia.

2 Response to "Space invaders: os genes "saltadores""

  • Clarissa Says:

    Parabéns! Muito bom o post! Me esclareceu um bocado desse lance de transferência horizontal de genes, afinal, molecular não é o meu forte na biologia...

    Eu acredito que a teoria dos vírus é a mais concebível, e a tua idéia de uma pandemia é bem interessante... E eu não poderia deixar de dizer que essa história toda, principalmente o que tu citou no último parágrafo me remetem automaticamente à Teoria do Caos... Se estou certa sobre esse meu pensamento, eu não sei...

    Vem cá, isso explicaria aquele caso do molusco que faz fotossíntese (*risco de estar falando besteira on*)?


  • L. Felipe Benites Says:

    Os molusculos fotossintetisantes, Elysia chlorotica podem ter adquirido o maquinario p a fotossintese atraves de um processo semelhante sim, de forma horizontal, louco não?

    e a teoria do caos, bem, sim, não... Pode ser visto dessa forma o processo GRANDE e dinâmico e imprevisivel da evolução, mas acho que as comparações param por ai...

    ;)